(A) que horas ela volta? (Em) que ano estamos mesmo?

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“Que horas ela volta?” O nome do filme indicado para representar o Brasil no Oscar tem um “erro de português”? Na língua culta, é evidente que sim. A gramática formal exigiria preposição: “A que horas ela volta”. Só que partir daí para dizer com ares alarmistas que o filme deixa o Brasil “mal na foto” – como fez neste artigo a jornalista Dad Squarisi, veterana colunista de português dos Diários Associados – é, este sim, um equívoco constrangedor. Revela visão curta sobre como a língua funciona.

O título do filme, tirado da fala de um personagem, está em registro coloquial. “Que ano você nasceu”, “Que série você estuda?” e frases do gênero são familiares a todos os brasileiros, mesmo os de alto grau de escolaridade. Falantes educados sabem – sem precisar pensar nisso – em que situações pega bem ou pega mal usá-las. Será preciso reafirmar a esta altura do século 21 que obras de arte têm liberdade para “transgressões” muito maiores?

Pretender que o título de um longa-metragem de ficção tenha obrigatoriamente o mesmo grau de formalidade de um editorial de jornal ou relatório de firma revela um jeito carrancudo e autoritário de compreender o funcionamento não só da língua, mas da arte também. Imagine (I can’t get no) Satisfaction, a famosa canção dos Rolling Stones, sendo corrigida pelo revisor da gravadora: “No, Mick, you CANNOT get ANY satisfaction”. E o que seria feito de “No meio do caminho tinha uma pedra”, o maravilhoso verso “errado” do Drummond?

12 pensamentos sobre “(A) que horas ela volta? (Em) que ano estamos mesmo?

  • 21/09/2015 em 11:19
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    Aiaiai, né?
    E eu aqui, na minha cruzada pró representação decente da oralidade brasileira, que tinha ficado pensando que quase seria mais recomendável que o filme se chamasse “que HORA ela volta?”
    🙂

    • 21/09/2015 em 11:20
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      Excelente sugestão, maestro!

  • 21/09/2015 em 15:59
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    Neste texto também há erros!
    Lembre-se que não devemos separar sujeito e verbo com vírgulas.

    • 21/09/2015 em 16:54
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      Bebeu, Anônimo? Cada uma. Não há nada parecido com isso no texto.

      (A propósito, convém deixar claro que comentários anônimos não mais serão aceitos aqui, regra básica da casa. Nome e email válido são essenciais. Dessa vez passa.)

  • 22/09/2015 em 07:57
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    As observações de Sérgio Rodrigues são perfeitas, irretocáveis.
    “O título do filme, tirado da fala de um personagem, está em registro coloquial. “Que ano você nasceu”, “Que série você estuda?” e frases do gênero são familiares a todos os brasileiros,”.
    Outros exemplos: “Que horas o trem chega?”, “Que horas você chegou ontem?”.
    Alguém acredita que Dad Squarisi nunca usou frases desse tipo?

  • 23/09/2015 em 00:03
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    Sem contar que a referida fala é atribuída a uma criança, conforme relata a filha da personagem principal ao contar para a mãe que, por estar tão distante dela, vivia perguntando: que horas ela volta?

    • 23/09/2015 em 15:13
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      Verdade, Wanir. Nem precisava, mas reforça o argumento.

  • 23/09/2015 em 22:16
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    Parabéns!

  • 24/09/2015 em 09:31
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    Olá, Sérgio.
    Ótimo post! Parabéns pelo blog, gostei muito.
    Sou revisora de textos e sempre me deparo com questões como essa.
    Aproveito para convidá-lo a conhecer meu blog, Português sem Mistério, em que publico dicas de português: http://portuguessemmisterio.com.br/
    Abraço,
    Betty

    • 24/09/2015 em 11:39
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      Olá, Betty. Muito obrigado e seja bem-vinda. Prometo aparecer em breve na sua casa virtual para uma visita! Um abraço e boa sorte para nós.

  • 02/12/2015 em 00:04
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    Não importa se o povo fala ou não assim. O título continua errado. Se é uma fala de personagem, então que se coloque a pergunta entre aspas. E não há nada de maravilhoso no verso errado do Drummond. Aliás, Drummond era péssimo!

    • 02/12/2015 em 17:03
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      Hahaha, é isso aí, Eduardo!

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