Chegado ou chego? Falado ou falo? (Opa!)

melhor chegoChegado é o único particípio do verbo chegar que a norma culta admite no Brasil e em Portugal.

Existem verbos de duplo particípio, chamados abundantes, como aceitar (aceitado e aceito) e gastar (gastado e gasto), mas chegar não pertence ao clube.

O particípio chego é uma criação popular documentada por linguistas em diferentes regiões de nosso país, em frases como “Quando distribuíram as senhas, eu ainda não tinha chego”.

Em versão substantivada, chego também tem forte presença na língua oral informal, numa expressão como “dar um chego”, isto é, “dar um pulo, uma passada” em algum lugar.

Mesmo assim, chego não encontra acolhida entre os gramáticos nem tem tradição de uso pelos chamados bons autores.

Caso semelhante é o de trago, particípio informal de trazer, de uso igualmente corriqueiro em frases como “Perguntei se ela tinha trago (por trazido) o presente” – e também condenado na norma culta.

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Registram-se outras criações populares parecidas, ainda que menos disseminadas, como perco (particípio de perder) e falo (particípio de falar), no Brasil, e caço (particípio de caçar) em Portugal.

Vale notar que existe uma regularidade na formação desses “particípios irregulares” sem pedigree: como ocorre com os (legítimos) aceito, gasto, pago e outros, a forma do particípio popular coincide com a do presente do indicativo da primeira pessoa do singular: eu chego, eu trago, eu perco, eu falo, eu caço…

Não é improvável que, com o tempo, algumas dessas formas emergentes acabem encontrando abrigo na língua culta. O mundo dos particípios irregulares sempre conviveu com boa dose de instabilidade.

Pego, particípio irregular do verbo pegar, é aceito pelos gramáticos no Brasil (mas não em Portugal). Pode ser que um dia chego siga os passos de pego, mas hoje isso não parece perto de ocorrer.

2 pensamentos sobre “Chegado ou chego? Falado ou falo? (Opa!)

  • 14/01/2016 em 22:09
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    Sérgio,

    Como essas palavras se tornam parte da norma culta? Um único gramático renomado decide, e os outros o seguem?
    E há aspectos da língua que uns consideram corretos na gramática normativa; e outros, não? Referindo-se,claro, à realidade brasileira, e não a brasileira e portuguesa.

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    • 27/01/2016 em 14:48
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      Lentamente, Daniel. Por sedimentação. E às vezes aos trancos e barrancos. Os gramáticos não atuam sempre em bloco, há discordâncias entre eles. Antes dos gramáticos, convém prestar atenção ao uso que fazem bons autores, autores cultos. No fim das contas o que vale mesmo é o bom senso. Um abraço.

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